“Secreto e Proibido” — Entre o medo e a resistência persiste o amor.
Por: Stephanie Sobral

“Foi um dos melhores dias da minha vida quando a conheci naquela manhã de domingo na pista de hóquei em Moose Jaw. Acho que eu tinha 18 anos. Ela tinha uns 22 anos, talvez. Então tudo começou em 1947. Parecia uma vida dupla. E rimos porque pensamos: “como pode ser assim?”. Tantos anos e ainda assim…parece que começou ontem.”
Fala de Pat sobre o dia que conheceu sua companheira Terry.
“Secreto e Proibido” (2020) se manifesta de diversas formas para mim. A primeira vez que assisti eu estava em casa, cumprindo o distanciamento social, em uma chamada de vídeo com a minha namorada. Terry e Pat nos arrancou lágrimas, sorrisos, certezas e um quentinho no peito. No documentário a trajetória do casal, que viveu um romance escondido da família por décadas, é contada com muito apreço, responsabilidade e ternura. Para mim, a história é apresentada através de uma tríade de elementos que sustenta e fortalece essa união: o medo, a resistência e o amor.
O MEDO
Esse sentimento, que sempre esteve presente na comunidade LGBTQIA+, também se manifesta na relação entre Terry e Pat. Vários acontecimentos revelam essa realidade. Seja pelo fato de Terry recusar os pedidos de casamento da Pat por anos, ou por se apresentarem como primas aos desconhecidos. E é claro, por terem escondido o relacionamento da família por quase 70 anos. Esses acontecimentos me fizeram refletir sobre como o medo da rejeição é uma constante durante toda a vida delas. Porém, após finalmente contarem seu segredo aos sobrinhos, a narrativa nos mostra que, com o passar dos anos e com a aceitação da família, o medo se desarma e a liberdade ganha espaço. Terry e Pat decidem afinal se casar e a cena desse momento desejado é uma das mais bonitas do filme. É uma demonstração genuína do quanto faz diferença sentir-se acolhido e aceito.

A RESISTÊNCIA
Ser LGBTQIA+ nunca foi fácil. Em nenhum momento da história humana. A resistência vem como resposta a esse mesmo medo de não ser aceito, pois a vontade de existir e de ser o que se é grita mais alto. Terry e Pat viveram em uma época na qual aconteciam batidas policiais em bares “suspeitos”. Levavam presas mulheres que usavam calça com zíper na frente e justificavam esse ato dizendo que estas queriam ser homens. Elas tinham medo. No entanto, resistiam. Escreviam cartas uma para a outra, mas riscavam seus nomes caso fossem pegas. Trabalhavam no mesmo lugar e todos os dias se caracterizavam de acordo com o que esperavam do seu gênero, para não levantar suspeitas do seu romance proibido. Construíram laços fortes com pessoas que também viviam vidas duplas: “amigos são tudo, muitas vezes os amigos são mais íntimos que a família” como diz Pat. E assim resistiram a repressão.

O AMOR
E é claro que eu não poderia deixar de comentar sobre o amor. Essa força que entrelaçada com a resistência supera o medo. Todos aqueles registros sensíveis, através da fotografia e das películas, de uma vida rica em cuidado, apreço e proteção. A forma como as duas se tocam, se olham e revivem o passado através da fala, trazendo a afeição e o respeito de uma com a outra, sem nenhum tipo de esforço, para mim, é a verdadeira definição de AMOR. Afinal, elas são o amor. Por fim, “Secreto e Proibido” é um documentário sobre uma trajetória de encher os olhos de felicidade, o peito de esperança e o corpo de aconchego. Vale a recomendação a todes que precisam de inspiração para resistir às repressões e fortalecer sua caminhada.

“Sempre lembrarei desta noite: pode ter sido só mais uma caminhada sob o luar, mas, amor, foi importante porque eu caminhei com você. Pode ter sido só mais uma noite, mais uma de sete. Minha querida, você estava comigo. Foi mais uma noite de paraíso. Nós passeamos quase em silêncio enquanto percorríamos a rota do luar. A felicidade me acometeu quando você sorriu e chamou meu nome. O tempo voou como se tivesse asas. De mãos dadas, caminhamos sozinhas. Foi uma noite inesquecível, mais uma noite para chamar de nossa.”
Uma das cartas feita por Pat Henshel para sua companheira Terry Donahue.